Pousada Aconchego

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Arte para o povo, pelo povo.


Passando pela avenida Floriano Peixoto, a casa de número 308 pode passar despercebida por qualquer
um. Mesmo os mais atentos podem ter dificuldades para atentar à placa que indica que o local não se
trata de uma simples residência. Mas bem aventurados são aqueles que se atém ao endereço 308, pois é
neste local onde funciona o ateliê do artista plástico Ricardo Tinôco.
No interior, as paredes estão repletas de desenhos nos mais diversos estilos. Na sala de entrada, uma
mesa redonda recepciona quem chega. Localizada no centro do espaço, ela tem muitas revistas
empilhadas e um busto branco usado para as aulas. Dado ao talento distribuído pelas paredes, este local
poderia ser facilmente confundido com os locais de trabalho de gente como Rafael Grampá, Gustavo
Duarte, ou até mesmo mestres como Laerte, Ziraldo ou Maurício de Souza. Mas ao contrário do que se
pode imaginar, os trabalhos eram de alunos do ateliê.
Ricardo Luís Tinôco de Araújo graduou-se em Artes pela Universidade Potiguar (UnP), na turma de 1999.
Entretanto, desde pequeno já desenhava. Na infância viveu em Parnamirim e foi naquela cidade que
começou a ter os seus primeiros contatos com o desenho. Mesmo que o ‘salário’ fosse algumas
palmadas do pai, quando arrancava a capa dos livros para poder praticar a arte na página de trás. Conta
ele que em outras situações, um artista local ao errar amassava a página e jogava no chão. O pequeno
Ricardo recolhia aquele papel e ia para casa tentar reproduzir aquela imagem.
Porém, o ponto máximo de suas traquinagens foi quando certa vez “um homem tinha uma mala com o
desenho do Tarzan. Mas ele nunca me emprestava para eu levar para casa e copiar o desenho. Um dia
eu peguei a mala, joguei todos os objetos dele no chão e fui para casa desenhar. Eu fiquei tão feliz com o
resultado que resolvi levar para mostrar o desenho ao homem e devolver a mala, mas acabei levando uns
tapas do dono”, concluiu.
Entretanto, com o tempo, Ricardo melhorou suas habilidades e chegou a se tornar militar, sendo hoje um
oficial da reserva. Ele também possuiu uma serigrafia. Porém, a partir de 2003, um outro projeto entrou
em sua vida: o ateliê, que surgiu para levar o aprendizado qualquer outra pessoa. “Eu recebi esse dom. O
homem lá de cima entregou esse dom para evoluir, pois estamos aqui para uma evolução espiritual. É
minha missão passar para outras pessoas”, concluiu.
O projeto de Ricardo Tinôco funciona da seguinte maneira: a mensalidade custa R$ 80 “para quem pode
pagar”. Entretanto, crianças carentes têm a oportunidade de aprender sem nenhum custo. Dessa
maneira, o projeto tem se mantido através dos anos. Hoje, cerca de 72 crianças carentes são atendidas,
advindas do programa SOS Aldeias Infantis. Do Grupo de Apoio à Criança com Câncer (GACC) vêm
alguns outros pequenos para aprenderem a desenhar. Durante as aulas, não há separação entre turmas
de pagantes e não pagantes. Todos dividem os mesmos espaços, exceto as crianças do GACC, devido
aos riscos de saúde para elas mesmas. Neste caso, um dia é reservado para o grupo.
Nestes dez anos de ateliê, Ricardo acredita que mais de mil pessoas já passaram pelo local. De acordo
com Tinôco, o primeiro objetivo é a evolução dos participantes. “O nosso primeiro objetivo é que eles
cresçam como profissionais”, disse. Hoje, as aulas não são ministradas apenas pelo artista, mas por uma
equipe de professores que colabora com as atividades. Todos eles ex-alunos da casa.
Thaennia Ferreira, 21 anos, é uma das que teve a oportunidade no projeto, agora já tem uma fonte de
renda e segue ajudando a descobrir novos talentos. A jovem está há quatro anos dentro do projeto, sendo
alguns poucos meses como aluna e os demais como instrutora. Para o futuro, Thaennia planeja prestar
vestibular para arquitetura. “É bacana estar aqui, pois tive aula com Ricardo e agora estou passando
adiante. É gratificante compartilhar o que aprendi”, concluiu.
O prédio onde hoje funciona o ateliê é cedido pelo ex-aluno do curso, Jucier Santos, pelo período de três
anos. Destes, um já se concluiu. O projeto funciona como um vetor de colaboração. Alimentos são
doados na instituição e repassados para oito famílias, que segundo Ricardo dependem destas cestas
básicas.
Para os alunos dentro da gratuidade, a única condição imposta pelo professor é de que eles tenham boas
notas em sala de aula, como também presença. “A gente educa com a arte do desenho”, disse o
professor completando, “se você educa a criança hoje, não vai precisar punir o adulto mais tarde”,
finalizou.
Faz parte dos planos de Ricardo Tinôco expandir o projeto, levando para outras cidades do Estado. Há
três meses, uma filial da escola foi aberta no município de São José de Mipibu. Neste momento, ela se
encontra fechada, mas somente enquanto um novo local para ser alugado ainda não é encontrado. A
próxima cidade que receberá o projeto é Parnamirim. Entretanto, este projeto está mais para o futuro.
O professor garante que “qualquer um pode desenhar, basta entender que a arte vem do coração”. Idade
não importa. Dona Jacira Safieh, 78 anos, é uma das mais ‘experientes’ do grupo ao qual já faz parte há
cinco anos. “A melhor coisa do mundo é pensar no futuro. E pensar no futuro é educar os meninos”,
completou Jacira. Na outra ponta, o pequeno David Alves Hiller, de 7 anos, está no projeto há 12 dias,
porém já mostra seu talento em desenhos produzidos.
O professor revela que uma parte dos alunos acaba se profissionalizando em desenho, seja na
arquitetura, nas artes visuais, HQs e que muitos deles começam a trabalhar para a própria escola. Outros
entram para a universidade e seguem seus rumos em empresas e intercâmbios. Ricardo Tinôco ressalta
que a chegada de muitos deles à escola acontece sem muita perspectiva por parte dos alunos.
Com os primeiros contatos com a pintura, os objetivos iniciais começam a ser traçados. Primeiramente, o
de desenhar como o professor. Mais tarde, de ser reconhecido, conseguir viver da sua arte e ir adiante.
Atualmente, o ateliê também funciona com um grupo de 14 alunos que fazem ilustrações de livros,
logomarcas. Todo o dinheiro que estes artistas ganham fica só para eles, estimulando neles a noção de
profissionalismo.
Portal JH

















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